quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Pesquisa dá mais utilidade à fava d'anta

Uma árvore do Cerrado que beneficia a população do Norte de Minas pode se tornar fonte de renda ainda mais importante. Hoje, pequenos agricultores vendem os grãos da fava d'anta para duas empresas farmacêuticas que extraem a rutina no Brasil. A substância é usada para a produção de medicamento que fortalece a parede dos vasos sanguíneos. Pesquisa desenvolvida no curso de pós-graduação em ciências agrárias, do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) da UFMG, descobriu que outro princípio ativo da planta, o galactomanano, pode vir a ser utilizado na indústria de iogurtes e sorvetes como espessante. O produto é importado da Índia e do Paquistão a um custo de R$ 18 a R$ 28 o quilo.


A pesquisa desenvolvida como tese de mestrado pelo agrônomo Manoel Ferreira de Souza investigou formas de repor a fava d'anta no Cerrado, já que há riscos de extinção da planta por causa da expansão da fronteira agrícola, que já reduziu esse tipo de vegetação a 60% do original no país. O risco de extinção também está no extrativismo predatório. Há alguns anos, agricultores chegavam a derrubar a árvore para colher as sementes. Hoje, com a ajuda da Universidade, eles já conseguem fazer a colheita com o uso de um instrumento chamado podão, conforme o pesquisador.
A intervenção da Universidade tem se mostrado também favorável para impedir que as sementes da árvore sejam repassadas aos atravessadores por preços muito baixos.
Reconhecendo o valor da planta, também há mais interesse na preservação como fonte de renda. "Em 2001, eles recebiam R$ 0,10 por quilo; em 2010, os atravessadores já pagam R$ 0,80 pelo quilo", diz Souza. Com a venda direta às indústrias, a estimativa é de que o quilo da vagem possa valer R$ 1,20 durante o período de colheita, que começa no final de abril e termina no início do mês de junho. O aumento da remuneração dos pequenos agricultores que pode vir com a exploração do potencial da planta tem relação direta com a preservação, como enfatiza Souza.

A pesquisa sobre a árvore foi realizada em dois anos, com base na vontade, como diz Souza, e com o apoio de R$ 1.045 mensais da bolsa do CNPQ. "Estudei em escolas públicas, escolhi o tema por causa da importância dele na vida das famílias daqui e porque acho que é a forma de dar o retorno que recebi com o recurso público", justifica o agora mestre em agronomia.A descoberta de mais dois princípios ativos na vagem da fava d'anta deve contribuir para aumentar o interesse e a preservação pela população.

Além da rutina, já usada pela indústria farmacêutica (processada na Alemanha), da substância que poderá ser espessante para sorvete, de alto potencial econômico, os pesquisadores descobriram que a semente da planta do Cerrado possui quercetina, que é usada como suplemento alimentar de soldados norte-americanos.


O grande trunfo dos pesquisadores contra a extinção da fava d'anta é a reprodução por meio de semeadura. O método será testado em outubro, na região de Montes Claros. "Conseguimos isso por indução já que o invólucro da semente é quebrado e quando ela entra em contato com a água começa o processo de germinação", explica Souza, complementando que, naturalmente, a germinação só acontece com a chegada da água da chuva. Ele acrescenta que o plantio não significa, de pronto, a multiplicação das árvores, mas garante a substituição das que vão morrendo aos cerca de 15 ou20 anos de idade.

Além de semear, a pesquisa vai recomendar aos agricultores que adubem as plantas nativas com esterco de curral e fosfato, o fertilizante mais barato do mercado. Souza observa que o maior obstáculo para os produtores encamparem o projeto é a baixa estima e, ainda, a falta de reconhecimento do valor da planta como fonte de renda.
A produtora rural Fátima Alves Ferreira, de 45 anos, diz que não pretende começar a plantar a fava d'anta neste ano. Ela foi a produtora que cedeu a área para a pesquisa sobre a árvore. "Teria pouco espaço para isso", desconversa, alegando também falta de estímulo. A árvore da fava d'anta pode atingir até 14 metros no Norte de Minas.

Em 2008, ela e mais 10 produtores conseguiram colher 15 mil quilos de vagem, mas, no ano passado, essa quantidade caiu para 4 mil quilos, em decorrência do ciclo produtivo natural da planta. Segundo as previsões da pesquisa, ao final de duas colheitas com as plantas adubadas, os produtores vão poder comparar o impacto na produção. A agricultora Fátima também se queixa da dificuldade de organizar o produto para vender. "É muito pesado e trabalhoso, a gente só pega porque precisa mesmo", queixa-se.

O pesquisador do ICA concorda com a agricultora e diz que os produtores precisam se organizar em associações ou cooperativas para facilitar a produção e a venda das sementes. "O mercado também é mal organizado e dificulta tanto o escoamento quanto a remuneração dos trabalhadores, sujeitos à ação dos atravessadores", destaca. Conforme Fátima, a produção dela e dos agricultores da região é vendida para a cooperativa de uma cidade próxima(Hoje em Dia).

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